Opinião

Implicações da dolarização de uma economia

Por João Carlos M. Madail
Economista, Professor, Pesquisador e Diretor da ACP
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Para alguns chefes de governo de países em recessão econômica com hiperinflação, como no caso da Argentina, que desbancou o Líbano e se tornou o país com a maior inflação do mundo, uma das formas de retomar a normalidade é gerar um "choque" de valorização da produção e dos salários com a aplicação do processo de dolarização. Economistas que estudam o tema concordam que não há mistério para realizar o processo. Para isso é preciso resgatar toda moeda nacional em circulação, em todas as operações na economia, e substituí-la por dólares. Esta operação já foi feita no Equador há 20 anos, promovendo a estabilização da economia numa época de enorme incerteza.

Embora esta não seja uma solução viável para todos os países, o Equador é um exemplo interessante de como políticas macroeconômicas fortes podem influenciar a direção de uma economia nacional com a criação de âncoras acreditáveis e o afastamento de influências políticas. Entretanto a mudança implicou sacrifícios e custos elevados. Os desafios foram grandes, dentre eles a carência de dólares para substituir a moeda nacional. No caso da Argentina, a dolarização exigirá primeiro que o governo reduza os gastos do Estado visando sair de déficit para um superávit fiscal. Para isso será necessário privatizar uma série de empresas estatais, reduzir os gastos públicos antes da dolarização. É claro que na prática não é tão simples assim. Com a dolarização da economia o país perde a capacidade de influenciar sua própria política monetária, ou seja, perde autonomia financeira. Isso decorre da dependência do país em relação à política econômica americana, com todas as suas virtudes e percalços. A dolarização requer investir em opções do mercado financeiro que estejam expostos à economia dos Estados Unidos. Assim sendo, o investimento pode ser feito tanto diretamente no mercado norte-americano quanto por meio de oportunidades presentes noutros países, como o Brasil.

O presidente argentino tem consciência de que o processo da substituição da moeda nacional não vai gerar resultados nos primeiros anos do governo. Segundo analistas, isso poderá ocorrer no médio prazo, com a imediata redução da inflação, mas não há garantia de que a dolarização gerará estabilidade econômica de forma automática. Para que o processo de dolarização de uma economia se viabilize, é preciso que esta seja forte e resiliente, que consiga se adaptar a choques mesmo sem a ferramenta da política monetária, o que parece não ocorrer na Argentina, nesse momento.

O país vive hoje uma espécie de dolarização parcial da economia. Isto porque apesar de a moeda do país ser oficialmente o peso argentino, o dólar também é aceito em qualquer operação. Como a atual inflação do país está próxima a 250%, os cidadãos têm feito suas compras em dólar para se proteger da inflação que corrói a moeda oficial. Portanto, a dolarização da economia de qualquer país parece atraente, mas sua implementação não parece simples. Não se trata apenas de converter as cédulas em circulação, mas também de empréstimos, e depósitos, o que não é algo tão automático e tem que haver um sistema de suporte para conseguir essa mudança. No entanto, quem acompanha a movimentação política do atual presidente argentino, nas suas manifestações, a única forma de reduzir a indomável inflação é a dolarização da economia, mesmo que o Banco Central do país venha a perder a sua capacidade de influenciar a política monetária local, perdendo a capacidade de emitir moeda e desaparecendo como credor de última instância. Há certo consenso entre as autoridades monetárias que o processo é muito difícil onde inexiste política monetária, mas exige uma disciplina fiscal rígida. Não havendo esta prática, num país um tanto dividido politicamente, dolarizar a economia é uma tarefa desafiadora.

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